sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Outeiro Alto


Assim se chamava o meu Parque de Campismo favorito. Não sei precisar há quantos anos o conheço mas seguramente há mais de 10… talvez 12 ou 13! Rendi-me ao seu encanto na primeira vez que lá estive. Era um parque diferente dos outros: não davam pendericalhos para por na tenda, não havia cartões de entrada, não havia qualquer tipo de chapola de marcação de gado. Tinha classificação de parque rural, o que na prática significa que tem o mínimo de comodidades, entenda-se, casa de banho e pouco mais. Mas este pouco mais é que fazia a diferença. A diferença entre acampar neste parque e fazer campismo selvagem limitava-se à vedação. Aquilo era praticamente selvagem. As pessoas que o procuravam, partilhavam todas o mesmo espírito e, mesmo de manhã bem cedo, havia gente com um sorriso na cara a dizer “Bom dia”, ainda cheios de remelas nos olhos (ao contrário do comum dos parques onde o mais provável é encontrar-se um velhote a desfazer a barba às seis da manhã para se preparar para tosquiar as sebes à volta da roulotte enquanto a mulher se agarra ao crochê para ver se completa mais um napperon ainda este verão). Mas de tudo, o melhor que este parque tinha, era a zona dos churrascos. Era, sem sombra de dúvidas, a melhor churrasqueira de qualquer parque onde já fiquei. Para quem nunca teve o privilégio de lá ir, aqui vai uma breve descrição: tinha um alpendre (onde o povo pendurava aqueles rolos de colar moscas) com uma mesa de madeira e bancos corridos; do lado da parede havia um armário (arriscava chamar-lhe aparador mas não sei se o termo é adequado) que mais parecia uma banca de carpinteiro; por cima, havia uma espécie de louceiro, ou seja, umas prateleiras que eram usadas como despensa da comunidade; à volta da mesa, em L, havia um muro onde se faziam as churrascadas. Este era o sítio onde toda a gente fazia as refeições. Cheguei a jantar lá com gente de todo o lado: Porto e arredores, Braga, Alentejo, Trás-os-Montes, Espanha, França, Itália e até mesmo com gente de Lisboa. Toda a gente partilhava comida e se algum ingrediente faltasse bastava olhar para a despensa comunitária (e para o prazo de validade também!). Com o passar dos anos, a única mudança à qual assisti no parque, foi a rotatividade de quem o explorava. As infraestruturas ficavam cada vez mais debilitadas e a manutenção era mínima. Chegamos a pensar levar um balde de tinta e pintar as casas de banho da noite para o dia, só para dar um ar mais arranjado àquilo. Mas quando lá chegamos este ano ficamos em choque. Mais uma vez os responsáveis do parque tinham mudado. E com eles veio uma nova era deste parque, a começar pelo nome: Gerês Green Park. Casas de banho pintadas, edifício principal pintado, mesas novas, bar completamente novo, portão novo, luzes no parque e, claro, preços novos. À primeira vista a mudança é para melhor. Mas a verdade é que mataram o parque. O espírito que outrora se vivia no parque jamais voltará. O Sr. Paulo, atual responsável pelo parque, está eufórico com o seu novo projeto, cheio de expectativa bastante entusiasmado. Mas, a meu ver, cometeu alguns erros que vão completamente contra o ideal deste sítio. Nos lugares das tendas foram colocadas umas tábuas com a identificação de cada lugar. Não me chocava se fossem tábuas simples com os números queimados na tábua (até dá um aspeto rústico). Mas nesses pauzitos foram aparafusadas umas placas em plástico com os números escritos a verde bisga radioativa (a condizer com o nome do parque). Agora, toda a gente tem que andar com uma pulseira (como nos festivais) e uma chapola no carro para, e passo a citar, “se se perderem toda a gente sabe que vocês estão aqui no parque”. As casas de banho estão todas fashion e os chuveiros têm torneiras novas daquelas que tem que se estar sempre a carregar para sair a água tépida (sim!, sim!, não é possível regular a temperatura), mas as fossas continuam entupidas! A pequena mercearia que lá existia também já não existe. A esposa do Sr. Paulo, com todo o respeito, é uma senhora mal encarada que não tem perfil para este tipo de vida. Nem tampouco sabe que o talho ainda é uma carrinha que vem uma vez por semana a Cabril e que o talho mais próximo fica a 40 km do parque, ou seja, o povo tem que conseguir preservar os alimentos em frigoríficos como sempre se fez lá. Mas pior de tudo, talvez por capricho desta senhora, a zona dos churrascos morreu. O mobiliário desapareceu todo e apenas se mantêm os muros e o alpendre que, no futuro, irão dar um ótimo espaço para pôr poufs e beber umas caipirinhas. Então e os churrascos? “Façam ali em baixo no sítio onde supostamente passa o riacho”. À noite, já nem as corujas se ouvem. A luz é tanta que encadeia tudo e todos (a senhora deve ter medo do escuro). Mas as inovações ainda não acabaram: está prevista a construção de bungalows (todos tunning) para que o parque possa abrir no inverno. Afinal, isto não era suposto ser um parque rural? Não era suposto ser um sítio onde o contacto com a natureza fosse máximo? Não era suposto ser um sítio onde a única coisa que o distingue do campismo selvagem é a rede à volta? Com estas inovações este parque está condenado a ser mais um retiro de snobs. Hei de lá ir no inverno para contar quantos lá estão (ah, claro! Sem contar com o fim de semana radical que o João Garcia vai lá passar a dar aulas de alta montanha a bombeiros; até agora o parque era demasiado selvagem para o receber!)…

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